Pedro Bernabé vai ficar no cargo até julgamento do mérito da ação que lhe cassou o mandato.
Despacho
Decisão Liminar em 19/09/2013 - AC Nº 59624 Ministro DIAS TOFFOLI
DECISÃO
Pedro Felício Estrada Bernabé, prefeito do Município de Birigui/SP, eleito no pleito de 2012, ajuizou ação cautelar, com pedido de liminar (fls. 2-33), visando à atribuição de efeito suspensivo a recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE/SP) que, mantendo sentença, julgou procedente ação de investigação judicial eleitoral, com base no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, para cassar o diploma do requerente e decretar a sua inelegibilidade pelo prazo de oito anos.
Sustentou, em síntese, que:
a) a Corte Regional afrontou o disposto nos arts. 5º, LVI, da Constituição Federal, e 332 do CPC, ao reconhecer como lícita a prova apresentada intempestivamente pelo ora requerido, consistente na listagem com nomes de eleitores supostamente aliciados;
b) as listas, que estavam em poder de Fabrício, foram subtraídas, conforme admitido por ele e por outra testemunha, em Juízo;
c) "[...] é inegavelmente ilícita a prova derivada da subtração de documentos, posto que é conduta penalmente relevante tanto o furto como a apropriação indébita [...]" (fl. 11);
d) "caso não se entenda ilícita a prova por estas razões, ela ainda seria inapta a produzir consequências processuais desfavoráveis ao requerente por ser, ainda, decorrência do anonimato vedado constitucionalmente. As listagens apareceram misteriosamente na sede do PTB, não se sabendo a forma como foram encaminhadas e sequer por quem foram encaminhadas" (fls. 11-12);
e) o teor do aresto regional releva divergência jurisprudencial e violação aos arts. 41-A da Lei nº 9.504/97 e 22, XIV e XVI, da LC nº 64/90;
f) não há prova nos autos da participação direta ou indireta do requerente nos fatos que ensejaram a procedência da ação, tendo a Corte Regional julgado com base em meras presunções, o que não se admite em sede de AIJE fundada em captação ilícita de sufrágio;
g) "os três depoimentos citados e transcritos pelo v. acórdão regional não autorizam a conclusão de que qualquer ato ilícito teria a responsabilidade ou expressa ciência do candidato recorrente" (fl. 18);
h) o envolvimento das testemunhas com o autor da ação e o fato de serem coautoras de um crime eleitoral são dois elementos que afastam a credibilidade dos depoimentos;
i) a prova documental avaliada pelo Tribunal Regional pode indicar a ocorrência de boca de urna, o que difere do ilícito descrito no art. 41-A da Lei nº 9.504/97;
j) "[...] a eventual violação a dever de cuidado (negligência) do requerente no trato de assuntos da administração de sua campanha significaria, no máximo, uma conduta culposa que não seria suficiente para atrair as sanções previstas para o ilícito do art. 41-A da Lei das Eleições, além do que a condenação, em hipótese como a do processo de conhecimento, se lastrearia em imprestável presunção que não pode prosperar" (fl. 24);
k) a Corte Regional também contrariou o disposto nos arts. 275 do Código Eleitoral, 131, 168, 379, 458, II, e 535, I e II, do CPC, 93, IX, da Constituição Federal, e 23 da LC nº 64/90;
l) houve omissão do Tribunal Regional, porquanto, "[...] (i) ao se analisar a questão da ilicitude da prova não se considerou o valor do testemunho de Fabrício, que em juízo reconheceu que os documentos estavam em seu poder e foram subtraídos; (ii) ainda com relação à prova ilícita, deixou-se de reconhecer que ela era derivada de anonimato, vedado pela ordem constitucional; (iii) deixou o voto vencedor de analisar os elementos de convicção cuja vinda aos autos foi admitida pelo relator, mas que não constaram do voto vencedor (apenas do voto vencido)" (fl. 28);
m) ¿por inexistir hierarquia entre as provas, o conteúdo das declarações deveria ser apreciado no voto dos embargos, especialmente porque por meio delas se deixa claro que jamais existiu um esquema de atuação ilícita, o que enfraquece a prova invocada na sentença e no acórdão" (fl. 30); e
n) "a prova testemunhal somente gerou a procedência da ação porque os nomes das testemunhas estavam na lista. A lista, assim, foi essencial para a procedência, de forma que a perda de credibilidade que advém das certidões indicadas nos autos conduz à conclusão de que a procedência não se sustenta" (fls. 30-31).
Requereu o deferimento da liminar para a concessão de efeito suspensivo ao recurso especial interposto nos autos do Processo nº 1392-48, garantindo ao requerente e ao seu companheiro de chapa o exercício pleno dos cargos de prefeito e de vice-prefeito, até o julgamento do apelo por esta Corte.
Em decisão de fls. 1.486-1.493, neguei seguimento à ação cautelar.
Daí o pedido de reconsideração cumulado com agravo regimental, no qual o agravante pretende a reforma da decisão agravada, com o consequente deferimento da liminar (fls. 1.495-1.515).
Defende a viabilidade do recurso especial, respaldado na ilicitude e fragilidade das provas, na inexistência de responsabilidade do candidato sobre fatos imputados a terceiros e na omissão do acórdão recorrido.
Ressalta que "[...] não se pode admitir, com o devido respeito e acatamento, que o produto da conduta criminosa tipificada no art. 155 do CP ou no art. 168 do CP sirva de fundamento para qualquer decisão judicial. Irrelevante que tenha havido comunicação tardia da ocorrência criminosa, já que a simples mora em se relatar o fato à autoridade policial não tem o condão de higienizar a prova espúria e ilegítima" (fl. 1.499).
Sustenta a ausência de pretensão de reexame de provas, mas a requalificação jurídica dos fatos.
Ressalta não haver "[...] nenhum liame entre o candidato e o fato, de sorte que não se pode deixar de reconhecer que o E. TRE/SP aplicou, ao caso, verdadeira - e inadmissível - responsabilidade objetiva" (fl. 1.507).
Argumenta que a decisão agravada deixou de se manifestar sobre a apontada violação ao art. 275 do Código Eleitoral pelo Tribunal Regional, que não analisou os documentos apresentados por ocasião da oposição de embargos.
Alega que "[...] os inúmeros elementos de prova essenciais ao correto deslinde da causa (contidos a partir de fls. 1087) continuaram sem apreciação do E. TRE/SP, mesmo após o julgamento dos embargos" (fl. 1.511).
Ao final, pugna pela reconsideração da decisão agravada ou o julgamento do agravo regimental em plenário para que seja deferido o pedido de liminar.
É o relatório.
Decido.
Em que pesem os fundamentos da decisão agravada, entendo que assiste razão ao ora agravante, especialmente em relação à ilicitude da prova.
Analisando melhor os termos do aresto regional, depreende-se, a princípio, ter havido omissão da Corte Regional ao não se manifestar sobre a alegação suscitada nos embargos de que as listagens apresentadas pelo autor da ação foram subtraídas da testemunha Fabrício, que confirmou tal fato em juízo.
Portanto, diante do que se infere dos autos neste juízo efêmero, tal questão, relevante para o deslinde da causa, não restou esclarecida no acórdão que julgou os embargos.
Com efeito, a origem ilícita da prova, decorrente de provável furto, pode acarretar a contaminação das demais provas produzidas, o que macula todo o conjunto probatório dos autos e desqualifica a condenação, incidindo ao caso a teoria dos frutos da árvore envenenada.
Em primeira análise, verifica-se que os depoimentos prestados em juízo decorreram das listagens nas quais continham nomes e dados de eleitores e cabos eleitorais, o que sustenta, a princípio, a tese de contaminação da prova por derivação. Nesse sentido, transcrevo os seguintes trechos da decisão regional (fl. 1.300):
Consigno que os nomes das duas testemunhas, Antonia Cristina (fls. 325 e Peterson Colombo (fls. 333) aparecem na lista identificada por Fabrício (fls. 300) como os nomes da boca de urna (50,00 + 70,00), fato que apenas vem reafirmar a procedência das alegações.
Outra circunstância que respalda a plausibilidade do recurso é a não participação dos candidatos nos atos praticados por terceiros.
Sobre o ponto, a jurisprudência desta Corte consagra o entendimento de que a condenação por captação ilícita de sufrágio, não obstante prescinda do pedido expresso de votos, demanda a demonstração cabal do conhecimento, anuência ou participação do candidato beneficiado nos atos praticados, que devem ser confirmados por meio de prova robusta, e não por presunção. Precedentes: RO nº 1539/MT, DJE de 4.2.2011, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Relator designado Min. Henrique Neves; REspe nº 35589/AP, DJE de 11.11.2009, Rel. Min. Marcelo Ribeiro; REspe nº 36335/AC, DJE de 21.3.2011, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior).
No caso em exame, assim decidiu o Tribunal Regional (fl. 1.298):
O fato de a campanha ter sido organizada por pessoas próximas do recorrente serve como justificativa para a sua desídia no controle da parte administrativa. Todavia, o fato de ter encontros diários com o coordenador de campanha também comprova que não havia total distanciamento das questões administrativas como transparece em seu depoimento.
Diante desse contexto, considerando o fato de que as condutas não foram praticadas diretamente pelos candidatos e que não se pode subtrair um mandato popular por presunção da prática de ilícito eleitoral, entendo que, no presente caso, é prudente que se aguarde o pronunciamento deste Tribunal antes da execução do julgado, ou antes que tal medida se torne irremediável, como na presente hipótese.
Por essas razões, concluo pela plausibilidade das alegações recursais a ensejar o acolhimento do pedido formulado.
Ante o exposto, reconsidero a decisão agravada para deferir a liminar pleiteada e conferir efeito suspensivo ao recurso especial interposto nos autos do RE nº 1392-48/SP, determinando o retorno dos requerentes aos cargos até o julgamento do apelo por esta Corte.
Comunique-se, com urgência, ao TRE/SP.
Cite-se.
Publique-se.
Brasília/DF, 19 de setembro de 2013.
Ministro Dias Toffoli, Relator.