Vistos. Dispensado
o relatório, nos termos do comando do artigo 38 da Lei nº 9.099/95. DECIDO.
Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER ajuizada por ZELINDA BARTHMAN REBECHI em
face do MUNICÍPIO DE BIRIGUI, visando recebimento de medicamentos. O interesse
processual da Autora é evidente, ante a resistência do Réu em satisfazer sua
pretensão. Passo à análise do mérito. A ordem constitucional vigente considera a
saúde direito de todos e dever do Estado, que a deve garantir por meio de
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e outros
agravos. Por ser direito de todos, a saúde é regida pelos princípios da
universalidade e da igualdade de acesso às ações e serviços que a promovem,
protegem e recuperam. Essas premissas estão consagradas no artigo 196 da
Constituição da República, que possui redação clara e imperativa. Saúde é
direito fundamental prioritário, não admissível de renúncia ou transação, em que
o Poder Público deve deitar atenção e ter como meta principal. Todavia, não é
esse o contexto observado ao longo dos anos no Estado brasileiro. Há absoluto
descaso por parte de governantes quanto à elaboração de políticas eficientes e
profiláticas na área da saúde, abandono de programas sociais e ausência de
investimento financeiro. O Estado passa a ser o principal violador desse direito
fundamental, sempre tentando justificar a desobediência ao dever constitucional
de prestar saúde de qualidade a todos os cidadãos brasileiros com base em
frágeis argumentos econômicos. A paisagem retratada está pintada no caso
vertente. A autoridade municipal empurra a responsabilidade na estadual que, por
sua vez, atribui para a federal. Enfim, nenhum dos entes da Federação cumpre com
seu dever e, no final, o argumento sempre deságua para a álea econômica. Tais
entes federativos se esquecem que a Constituição não tergiversa sobre direito à
saúde. Não abre espaço para negociação. É um imperativo o dever de prestar saúde
de qualidade e um direito universal. Nenhuma lei infraconstitucional pode
restringir um direito garantido na Carta Constitucional, sob pena de ficar
eivada de inconstitucionalidade. No caso concreto, está demonstrada a
necessidade da Autora de fazer uso dos medicamentos solicitados na inicial (fls.
22). Cabe ao Poder Público fornecer os meios necessários ao restabelecimento da
saúde da Autora, não interessando se a verba vem da União, Estado ou Município,
pois a responsabilidade é concorrente. Ademais, quando estamos lidando com saúde
não há espaço para burocratização. Desta sorte, se foi feito prévio pedido
administrativo, se o medicamento consta em lista do SUS, etc, tudo isso é
questão de lana caprina. O fundamental é garantir e restabelecer a saúde do
cidadão. A pessoa humana é o centro do ordenamento jurídico. O Estado existe em
função do ser humano. Quando se trata de direitos fundamentais, não é admissível
apego a letra fria da lei, uso de técnicas de hermenêutica, a não ser que tais
meios sejam utilizados para conferir maior eficácia a direitos. O Superior
Tribunal de Justiça, atento a tais diretrizes, decidiu: CONSTITUCIONAL. RECURSO
ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA OBJETIVANDO O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO
(RILUZOL/RILUTEK) POR ENTE PÚBLICO À PESSOA PORTADORA DE DOENÇA GRAVE: ESCLEROSE
LATERAL AMIOTRÓFICA - ELA. PROTEÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. DIREITO À VIDA
(ART. 5º, CAPUT, CF/88) E DIREITO À SAÚDE (ARTS. 6º E 196, CF/88). ILEGALIDADE
DA AUTORIDADE COATORA NA EXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DE FORMALIDADE BUROCRÁTICA. 1
- A existência, a validade, a eficácia e a efetividade da Democracia está na
prática dos atos administrativos do Estado voltados para o homem. A eventual
ausência de cumprimento de uma formalidade burocrática exigida não pode ser
óbice suficiente para impedir a concessão da medida porque não retira, de forma
alguma, a gravidade e a urgência da situação da recorrente: a busca para
garantia do maior de todos os bens, que é a própria vida. 2 - É dever do Estado
assegurar a todos os cidadãos, indistintamente, o direito à saúde, que é
fundamental e está consagrado na Constituição da República nos artigos 6º e 196.
3 - Diante da negativa/omissão do Estado em prestar atendimento à população
carente, que não possui meios para a compra de medicamentos necessários à sua
sobrevivência, a jurisprudência vem se fortalecendo no sentido de emitir
preceitos pelos quais os necessitados podem alcançar o benefício almejado (STF,
AG nº 238.328/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 11/05/99; STJ, REsp nº 249.026/PR,
Rel. Min. José Delgado, DJ 26/06/2000). 4 - Despicienda de quaisquer comentários
a discussão a respeito de ser ou não a regra dos arts. 6º e 196, da CF/88,
normas programáticas ou de eficácia imediata. Nenhuma regra hermenêutica pode
sobrepor-se ao princípio maior estabelecido, em 1988, na Constituição
Brasileira, de que "a saúde é direito de todos e dever do Estado" (art. 196). 5
- Tendo em vista as particularidades do caso concreto, faz-se imprescindível
interpretar a lei de forma mais humana, teleológica, em que princípios de ordem
ético-jurídica conduzam ao único desfecho justo: decidir pela preservação da
vida. 6 - Não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e sim,
considerá-la com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do legislador,
mormente perante preceitos maiores insculpidos na Carta Magna garantidores do
direito à saúde, à vida e à dignidade humana, devendo-se ressaltar o atendimento
das necessidades básicas dos cidadãos. 7 - Recurso ordinário provido para o fim
de compelir o ente público (Estado do Paraná) a fornecer o medicamento Riluzol
(Rilutek) indicado para o tratamento da enfermidade da recorrente. (STJ – ROMS -
RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA-11183 Processo: 199900838840 UF: PR
Órgão Julgador: PRIMEIRATURMA Data da decisão: 22/08/2000 Documento:
STJ000367929, DJ DATA:04/09/2000 PÁGINA:121 RSTJ VOL.:00138 PÁGINA:52, Min. JOSÉ
DELGADO) Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, a fim de OBRIGAR o Réu a
fornecer a Autora o medicamento descrito na inicial ou genérico pelo tempo que
for necessário ao restabelecimento da saúde dela. Tutela antecipada confirmada.
Sem honorários advocatícios e custas processuais. P.R.I.C. Birigüi, 27 de junho
de 2013. CARLOS GUSTAVO DE SOUZA MIRANDA Juiz de Direito
|